
Por Adriana Stamato, Gian Evaso e Letícia Sequeira
Assim como todos os mais relevantes setores da economia, a indústria farmacêutica não escapou dos impactos da Reforma Tributária, sendo essencial que as empresas do setor se preparem para as mudanças trazidas pela Emenda Constitucional n.º 132/2023 e pela Lei Complementar n.º 214/2025.
Atualmente, a sistemática de tributação sobre os medicamentos é bastante complexa, com regimes de apuração específicos de tributos em todas as esferas da Administração Pública, com destaque para PIS/COFINS e ICMS.
Em linhas gerais, os medicamentos podem estar sujeitos a três tipos de tributação pelo PIS/COFINS: lista positiva (com crédito presumido), lista negativa (sem crédito presumido) e lista neutra (regime não cumulativo). O ICMS, por sua vez, incide com alíquotas que variam conforme a unidade federativa, havendo diversos Convênios prevendo isenção em determinadas situações.
A Lei Complementar n.º 214/2025 simplifica os regimes atuais, prevendo hipóteses de redução das alíquotas de IBS e CBS (i) em 60% das alíquotas sobre todos os medicamentos registrados na Anvisa ou produzidos por farmácias de manipulação; ou (ii) alíquota zero do IBS e da CBS sobre o fornecimento dos medicamentos relacionados no Anexo XIV, que contempla produtos para tratamento de diversas enfermidades.
Além disso, também ficam reduzidas a zero as alíquotas do IBS e da CBS, com direito à manutenção integral do crédito das etapas anteriores, as operações de fornecimento de todos medicamentos registrados na Anvisa para (i) órgãos da administração pública direta, autarquias e fundações públicas e (ii) as entidades de saúde imunes.
O sistema parece mais simples do que o presente em virtude de uma melhor uniformidade das regras, mas ainda assim traz algumas dificuldades e desafios em relação à precificação, especialmente por se tratar de um mercado regulado e altamente competitivo. De um lado, a extinção do PIS/COFINS já em 31/12/2026 permitirá que a cadeia de comercialização dos medicamentos passe a apurar débitos e créditos de IBS e CBS (o que é parcialmente vedado no regime monofásico). Por outro lado, o longo período de transição e a coexistência de regras que não são idênticas para aplicação de benefícios fiscais será bastante desafiadora para a indústria e demais envolvidos na cadeia de distribuição. Some-se a isso o fato de os novos tributos passarem a ser devidos no destino, o que irá também afetar regimes diferenciados de ICMS que são bastante comuns no setor.
Um outro fato que merece atenção é o mecanismo de atualização das listas de medicamentos sujeitos aos benefícios de redução de 100%. Aliás, a própria existência da lista em si já é um ponto de crítica, uma vez que a indicação taxativa dos medicamentos sujeitos ao benefício pode dificultar o acesso a tratamentos mais modernos.
Há receio que a possibilidade de inclusão anual, sujeita a ato conjunto do Poder Executivo da União e Comitê Gestor não seja suficiente para atendar à demanda de maior agilidade e flexibilidade almejada pelo setor, até porque não há garantia no texto que isso irá ocorrer de forma automática, o que fere o princípio da isonomia e neutralidade. Vale dizer que para os Anexos que contemplam as listas de dispositivos médicos, dispositivos de acessibilidade e composições sujeitas à redução de 60% a previsão é que a atualização possa ocorrer a cada 120 dias.
A Reforma Tributária, de fato, trará um impacto relevante para o setor de medicamentos – é essencial que as empresas estejam preparadas para se adaptar às novas regras, revendo modelos de produção e distribuição, especialmente durante o período de transição.
Adriana Stamato é Sócia/Partner em Trench Rossi Watanabe.
Letícia Sequeira é Advogada na Trench Rossi Watanabe.
Gian Evaso é Associado Sênior em Trench Rossi Watanabe.
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