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Como as empresas podem se preparar para os novos desafios e oportunidades

Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante cerimônia de sanção do Projeto de Lei Complementar nº 68/2024 de regulamentação da Reforma Tributária, no Palácio do Planalto. Brasília – DF – Foto: Ricardo Stuckert via PR

Por Juliana Zobaran

A complexidade do sistema tributário brasileiro tem sido um dos principais entraves ao crescimento econômico, impactando diretamente a competitividade das empresas. Com um modelo fragmentado e caracterizado por sobreposição de tributos, altos custos de conformidade e insegurança jurídica, a necessidade de uma reforma tributária tornou-se inadiável.

A nova legislação, estabelecida pela Lei Complementar nº 214/25, reestrutura a tributação sobre o consumo ao substituir tributos como Pis, Cofins, ICMS, ISS e IPI pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e pela Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS). O objetivo é proporcionar maior simplicidade, transparência e neutralidade fiscal. No entanto, a transição para esse novo modelo trará desafios e oportunidades para as empresas, que precisarão adaptar sua gestão tributária, planejamento financeiro e estrutura contratual.

Essa reestruturação exige planejamento tributário robusto, uma vez que impacta significativamente a gestão fiscal e operacional das empresas.

Pretende-se, portanto com este artigo analisar algumas transformações do novo modelo tributário, seus desafios e oportunidades, fornecendo assim recomendações estratégicas para empresas de todo e qualquer porte.

1. Precificação e Formação de Custos

Atualmente, os tributos sobre consumo são incorporados aos preços (“tributação por dentro”), o que não é transparente por exemplo para o consumidor-final. Com a reforma, a cobrança passará a ser destacada na nota fiscal, exigindo ajustes na precificação de produtos e serviços. Neste sentido, as empresas devem revisar contratos, estabelecendo o preço líquido efetivo do produto ou serviço e segregar os impostos a serem aplicados. Assim, reavaliar o impacto da carga tributária nos custos de aquisição e na formação de preços é necessário para manter a competitividade.

2. Impactos em Contratos

Na mesma toada de revisão dos contratos, a reforma não prevê reequilíbrio econômico-financeiro automático para contratos privados, criando um risco para empresas que firmam acordos baseados no modelo tributário atual. Recomenda-se a renegociação de cláusulas para evitar distorções econômicas e prejuízos futuros.

3. Análise do Cadastro de Fornecedores e Clientes

Como adquirente, a empresa precisa ter certeza de que, ao pagar a nota fiscal emitida pelo fornecedor, os tributos referentes àquela operação foram recolhidos. Isso é essencial porque a nova regra determina que o crédito tributário só pode ser aproveitado se o tributo tiver sido efetivamente pago pelo fornecedor. Dessa forma, empresas precisarão garantir que seus fornecedores estejam em conformidade fiscal para evitar impactos negativos na apuração de créditos. Fornecedores do Simples Nacional, por exemplo, podem ter restrições na geração de créditos.

4. Revisão da Estratégia Logística

Com a tributação no destino e o fim gradual da guerra fiscal até 2033, a localização de fábricas e centros de distribuição precisará ser reavaliada. As áreas fiscal, logística e comercial devem trabalhar juntas para readequar a distribuição e identificar novas vantagens competitivas. Ou ainda aproveitar ao máximo os benefícios dispostos agora, para saber expurgar tais benefícios em 2033.

5. Compensação de Créditos Tributários

A reforma traz regras específicas para a compensação e ressarcimento de créditos acumulados.

Créditos Acumulados de PIS/Cofins

•          Poderão ser utilizados para compensação com a CBS.

•          Ressarcimento poderá́ ocorrer em dinheiro ou compensação com tributos federais.

•          Continuidade do aproveitamento conforme regras vigentes.

Créditos Acumulados de ICMS

•          Poderão ser compensados com o IBS em até 240 parcelas mensais corrigidas pelo IPCA, a partir de 2033.

•          Estados manterão o controle da homologação dos saldos.

Empresas devem fazer um levantamento detalhado de seus créditos acumulados e buscar formas de monetizá-los o quanto antes. Com a transição para o novo sistema, o prazo e a forma de ressarcimento de créditos podem sofrer alterações, tornando esse um ponto crítico para a saúde financeira dos negócios.

6. Investimento em Tecnologia e Compliance

Durante o período de transição (2026-2033), empresas precisarão operar sob dois sistemas tributários simultaneamente. Isso aumentará a complexidade operacional, tornando essencial o investimento em ERPs atualizados e sistemas de compliance tributário para minimizar riscos e garantir a correta apuração dos tributos.

7. Análise de Fluxo de Caixa e Planejamento Financeiro

A implementação do novo sistema tributário exige uma avaliação minuciosa do impacto nos fluxos de caixa das empresas. Com a introdução do split payment, parte dos tributos poderá́ ser retida diretamente no momento da transação, reduzindo o valor líquido recebido pelas empresas e, consequentemente, afetando o capital de giro. Diante dessa mudança, torna-se essencial projetar diferentes cenários financeiros, avaliando a necessidade de capital de giro adicional para lidar com a mudança no timing de pagamento e apropriação de créditos e, revisar a necessidade de liquidez para evitar impactos negativos no fluxo de caixa e manter a capacidade operacional e de investimento.

8. Impactos no Transfer Pricing e Relações Intercompany

A extinção de regimes como o Pis/Cofins monofásico e a substituição tributária (ICMS-ST) trará novos desafios para transações intercompany. Empresas multinacionais precisarão revisar suas políticas de preços de transferência para garantir conformidade e eficiência fiscal dentro das novas regras.

9. Lifelong learning journey – Capacitação Contínua dos envolvidos

A capacitação contínua dos profissionais envolvidos na Reforma Tributária é essencial para garantir uma implementação eficaz e a correta interpretação das novas regras fiscais. A complexidade e o impacto das mudanças exigem uma mentalidade de lifelong learning, onde empresas, contadores, advogados e demais stakeholders estejam em constante atualização para acompanhar a reforma. A aprendizagem contínua não é apenas uma necessidade operacional, mas uma estratégia para que as empresas se mantenham competitivas e os profissionais preparados para os desafios da nova realidade fiscal.

10. Projeto da Empresa e não somente da área fiscal!

A implementação da reforma tributária exige que todos os departamentos impactados estejam alinhados. A área fiscal não pode ser a única responsável por essa transição; é necessário engajamento da alta administração e capacitação contínua das equipes para garantir uma adaptação eficiente.

Conclusão

A reforma tributária representa um passo significativo na modernização do sistema fiscal brasileiro. Muito embora os desafios sejam consideráveis, as empresas que se prepararem estrategicamente poderão transformar essa mudança em uma vantagem competitiva.

Principais Recomendações: (#Ficam as dicas!)

✅ Ajustar a precificação para evitar distorções tributárias.

✅ Revisar e renegociar contratos para mitigar impactos financeiros.

✅ Reavaliar a localização de operações logísticas.

✅ Mapear créditos acumulados e otimizar sua compensação.

✅ Atualizar sistemas, processos e equipes para garantir conformidade.

Com um planejamento tributário eficiente e uma gestão integrada, as empresas poderão atravessar essa transição com maior segurança, garantindo previsibilidade fiscal e eficiência operacional a longo prazo.


Juliana Zobaran é executiva C-Level com mais de 25 anos de experiência na área Jurídica e Tributária, é Diretora LATAM & México de Impostos do Grupo Vantiva e Vice-Presidente do Capítulo Latam do Tax Executives Institute. Advogada e contadora, possui LL.M em Direito Empresarial pelo IBMEC, MBA em Gestão Tributária pelo FIPECAFI e formação em Excelência em Gestão pelo Gordon Institute of Business Science, na África do Sul. Especialista em M&A, planejamento tributário e compliance, liderou projetos para redução de carga tributária em multinacionais como Publicis, Coca-Cola, Vale e Anglo American. Professora e palestrante, também atua como Conselheira em Diversidade, Inclusão e ESG. Duas vezes vencedora do Prêmio Confeb como Diretora Tributária in-house e Profissional do Ano em 2019.


Os artigos escritos pelos “colunistas” não refletem necessariamente a opinião do Portal da Reforma Tributária. Os textos visam promover o debate sobre temas relevantes para o país.

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