
Por Marcelo Davatz, do Tax Is Cool Plus
A recente aprovação da Reforma Tributária, formalizada pela Emenda Constitucional 132/2023 e regulamentada pela Lei Complementar nº 214/2024, representa um marco significativo em nosso sistema tributário. Uma pesquisa da consultoria PwC revela o elevado “custo Brasil”, que engloba as horas despendidas em processos tributários e jurídicos, além dos impostos corporativos, trabalhistas e de consumo. Enquanto a média global para o cumprimento de obrigações acessórias tributárias, segundo a consultoria, são de 240 horas (30 dias), na América do Sul essa média sobe para 547 horas (60 dias). No Brasil, surpreendentemente, as empresas necessitam de 1958 horas (245 dias) para estarem em conformidade.
Embora a reforma vise simplificação, transparência e a eliminação do “tributo em cascata”, a versão aprovada reflete um intrincado processo federativo, conciliando diversos interesses setoriais. O resultado foi a criação de um IVA dual e uma alíquota efetiva estimada em 28%, substituindo o ICMS, ISS, PIS e COFINS pela Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) – um tributo federal – e pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) – um tributo que abrange estados e municípios. Além disso, a cobrança dos tributos foi deslocada para o destino, e não mais para a origem, e a apropriação dos créditos passará a ser financeira, ou seja, após o pagamento efetivo na etapa anterior, e o fim da cumulatividade. Essas mudanças, após o período de transição, tendem a gerar padronização e simplificação.
Uma preocupação significativa levantada pelos contribuintes reside no longo período de transição estabelecido para o novo sistema tributário. A coexistência do sistema atual e do novo modelo por dez anos acarretará custos de conformidade elevados e a necessidade de contratar inúmeros prestadores para adaptações. A Reforma Tributária não impactará apenas os profissionais da contabilidade e do setor tributário; ela representa uma oportunidade para uma profunda revisão de negócios. É imperativo que todas as áreas da empresa revisitem seus processos e estratégias para se adequarem às novas diretrizes, garantindo um futuro mais estável e próspero. A reforma impactará toda a empresa.
Sob a ótica financeira, é crucial analisar o impacto no fluxo de caixa, especialmente no que tange à antecipação no pagamento de créditos, à monetização de saldos credores de tributos, bem como os efeitos do split payment na operação. Na área de TI, o mapeamento e a reparametrização de sistemas e regras fiscais são essenciais. Para as equipes de Tax & Accounting, o desenho de cenários e simulações são indispensáveis para avaliar o impacto do fim dos incentivos fiscais. As áreas de COMEX e TP devem revisar preços de vendas e custos de aquisições, antecipando negociações e revisões contratuais. Por fim, a Estratégia de Negócios e Logística exige um redesenho logístico-tributário para empresas com alta dependência de incentivos fiscais, considerando a redução gradual desses benefícios a partir de 2029 e a extinção total em 2033. Essa análise de cenários tributários e logísticos pode revelar que a localização atual de muitas empresas não fará mais sentido, sendo necessária uma mudança para outras localidades mais próximas ao seu mercado consumidor, visto que a instalação original muitas vezes foi motivada por benefícios tributários.
Navegar por essa reforma exige um diagnóstico aprofundado, um design estratégico e decisões fundamentadas em dados. O mapeamento das frentes tributária, jurídica, tecnológica e da cadeia logística é o ponto de partida. Posteriormente, o desenho de uma nova malha logística, integrada aos cenários tributário e jurídico, permitirá decisões informadas, baseadas em simulações. Ressalta-se que a reforma não apresenta apenas riscos; ela pode se transformar em um atalho e uma vantagem competitiva para aqueles que compreendem a estratégia logística. O início dessa jornada consiste no mapeamento dos processos atuais (“As Is”) e na identificação de como serão afetados pela reforma e otimizados pela logística (“To Be”). Cada área contribuirá com sua perspectiva: a área Tributária mapeará fluxos de impostos, créditos e obrigações acessórias; a Logística, rotas, custos de frete, localização de estoques e o impacto do princípio do destino; o Jurídico, contratos com clientes/fornecedores, estruturas societárias e riscos legais; e a Tecnologia, sistemas (ERP, Fiscais, WMS, TMS), dados e integrações necessárias.
Para quem vive o dia a dia corporativo, sabemos que qualquer mudança dessa magnitude exige uma revisão cuidadosa das estratégias do negócio, rotas logísticas e estruturas de precificação. Trata-se de recalibrar toda a operação para preservar a competitividade e resiliência.
Este é, portanto, um momento oportuno para que os empresários reavaliem suas organizações, analisando detalhadamente cada área. É fundamental considerar se a estrutura atual ainda é adequada ou se, com a mudança na tributação do local de fabricação para o destino, a localização e a estrutura atuais ainda farão sentido nesse novo cenário pós-reforma.
Marcelo Davatz, advogado, contador, Diretor Tributário do Simões Pires, Embaixador do Taxi s Cool Plus e conselheiro fiscal.
Esse artigo foi escrito por integrantes do Tax Is Cool Plus, escola de protagonismo para profissionais e comunidades de tax.
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